sábado, 8 de fevereiro de 2014

Cantigas de Roda, o novo álbum dos Raimundos.

*por Guilherme Fernandes


Mesmo 13 anos após a primeira mudança de formação, a banda Raimundos ainda desperta diferentes reações entre seus fãs. Há quem torça o nariz para a formação atual e defenda que a banda acabou em 2001. Há quem viva fazendo apelos para que o ex-vocalista volte para a banda. 

Mas também há aqueles que apoiaram o trabalho dos membros remanescentes e têm acompanhado a banda desde então (como é o caso desse que vos escreve). De qualquer forma, querendo ou não, os Raimundos em sua formação atual possuem um grande séquito de fãs fiéis.

A prova maior disso é que o mais novo trabalho da banda, Cantigas de Roda, foi totalmente financiado pelos fãs, através de um sistema de doações chamado Crowdfunding. O valor estimado em R$ 70.000 para cubrir os custos de viagem, gravação, produção, mixagem e prensagem foi atingido com uma rapidez surpreendente, e ultrapassou os R$ 120.000. Nada mal para uma banda que muitos dizem já ter acabado.

Enfim, vamos ao que interessa: o Review do álbum! 

Cantigas de Roda!

Pode-se dizer que o disco surpreende positivamente. Nota-se uma evolução substancial em relação ao Kavookavala (2003) - o primeiro disco da era pós-ruptura -, tanto técnica quanto criativa. Desde a volta do Canisso ao contrabaixo em 2007, acompanhada da saída de Fred da bateria, os Raimundos têm passado por um processo de consolidação da formação atual e mudança de filosofia. Apesar dos apelos dos fãs por material inédito, os integrantes entenderam que o momento era de fazer shows por todo o país e provar que a banda continua viva. O DVD ao vivo Roda Viva (2010), gravado em SP no Kazebre, e o single Jaws lançado pouco antes despertaram nos fãs a curiosidade de como a formação renderia no estúdio.

Se em Kavookavala as músicas vinham carregadas de ressentimento em relação ao ex-vocalista, em Cantigas de Roda a banda parece ter superado esse sentimento. Pode-se dizer que de um modo geral é um disco mais leve. 

Claro, mais leve no que diz respeito às letras. Porque musicalmente, o peso e a crueza característicos dos trabalhos anteriores estão presentes. O produtor Billy Graziadei (vocalista do Biohazard) soube extrair o melhor da sonoridade da banda nas gravações. O baterista Caio Cunha, apesar de ser mais técnico que seu antecessor Fred, conseguiu manter a simplicidade e precisão à qual os fãs estão acostumados, fazendo com que a banda mantenha sua identidade. O timbre característico das guitarras de Digão e Marquim continua marcando presença. O baixo do Canisso dispensa comentários, e o Digão, além de se mostrar muito mais à vontade fazendo a voz principal, prova nesse novo trabalho que dá conta de cantar as músicas mais rápidas perfeitamente.

Em Cantigas de Roda, a banda faz um passeio pelos mais diversos ritmos que marcaram os trabalhos anteriores. O disco abre com a música Cachorrinha, um hardcore visceral que lembra a fase do álbum Lapadas do Povo, sensação essa que também tive ao ouvir Rafael: velocidade na batida e nos vocais, e guitarras com afinação mais baixa. 

Esse peso das guitarras também está presente em canções como a excelente BOP e Politics. Enquanto a primeira fala sobre a importância que os fãs tiveram para que a banda seguisse em frente, a segunda já é conhecida por quem acompanha os trabalhos recentes dos Raimundos: foi lançada em 2013, inspirada pela onda de protestos que ocorreu em todo o país durante a Copa das Confederações, e apresenta uma letra de cunho político. A surpresa dessa regravação é a participação do próprio Billy Graziadei.

Para quem sente falta da mistura entre forró e hardcore que marcou o primeiro álbum, com direito a triângulo e letra de duplo sentido: a música Gato da Rosinha, versão para uma pérola do Zenilton, segue nessa linha, lembrando tanto as outras versões já feitas para as músicas dele, quanto algumas composições como Minha Cunhada e Marujo.

Nesse disco, nota-se que há mais espaço para o Hardcore melódico, ainda que sem perder a distorção e o peso característicos das guitarras, como pode-se observar em canções como Baculejo (regravação de um projeto-solo do Digão, o Dr. Madeira), Descendo na Banguela, Importada do interior e a sensacional Nó Suíno, que também fala sobre as dificuldades encontradas ao terem insistido na banda.

Para tornar o trabalho mais completo, ainda há a canção Gordelícia - algo como uma versão sacana da homenagem que o Roberto Carlos fez em 1993 à beleza renascentista das gordinhas, com uma levada Ska que lembra músicas como Me Lambe e Papeau Nuky Doe; a baladinha Será Quente, com uma letra impagável e putamente bela, além de um solo de guitarra com uma harmonização sensacional; e a surpreendente Dubmundos. Digo surpreendente porque se trata de um estilo inédito na obra dos Raimundos, e o resultado ficou muito bom.

Resumo da Ópera: Cantigas de Roda é um álbum que vale a pena ser ouvido, mesmo por aqueles que questionam a formação atual dos Raimundos. É um disco que não deixa a desejar na qualidade sonora, e que embora a banda tenha revisitado suas raízes, apresenta uma diferença criativa em relação aos primeiros discos. O que é natural, levando-se em consideração que obviamente houve uma mudança de comportamento por parte dos integrantes remanescentes ao longo desses mais de 20 anos de estrada. De qualquer forma, a sacanagem e o peso ainda estão presentes, e independente da formação, é inegável a qualidade desse trabalho.

Faixas:

01 - Cachorrinha - Participação: Frango (banda Galinha Preta)
02 - BOP
03 - Baculejo
04 - Gato da Rosinha 
05 - Cera Quente (no encarte consta como Será Quente)
06 - Rafael 
07 - Descendo na Banguela 
08 - Dubmundos - Participações: Sen Dog (Cypress Hill), Stu Ranier (Urban Classics) no baixo, e Ulises Bella e Sheffer Bruton nos metais
09 - Nó Suíno
10 - Importada do Interior 
11 - Gordelícia - Participações: Ulises Bella e Sheffer Bruton nos metais 
12 - Politics - Participações: Cipriano e Billy Graziadei (Biohazard) nos vocais

Digão: Voz/Guitarra/Triângulo
Marquim: Guitarra/Vocais
Canisso: Contrabaixo/Vocais
Caio Cunha: Bateria/Vocais

Por Guilherme Fernandes: corintiano, maloqueiro e sofredor, fã de Raimundos desde criança e feliz pela saída do Ibson do Timão.
_"Veja o sol que vai se abrir. Dentro do coração há uma ideia boa querendo fluir"

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